Assembleia enterra CPI do MST, mas invasões de terras serão investigadas na Câmara

foto texeira nova

José Carlos Teixeira*

“A bandeira vermelha se moveu

É um povo tomando posição

Deixe o medo de tudo pra depois”

(Sem Terra, de Zé Ramalho)

 

Abatida por uma parecer da Procuradoria Jurídica da Assembleia Legislativa, a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar as recentes invasões de terras registradas na Bahia, sob o comando do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, o MST, foi sepultada. A Procuradoria considerou a proposta inconstitucional, com o argumento de que a competência para tratar o assunto é federal e não estadual.

Patrocinada pela oposição, que não escondia a intenção de apurar um suposto envolvimento do governo estadual nas ações do MST, o requerimento de criação da CPI havia recebido também as assinaturas de uma dezena de deputados da base governista, entre eles o próprio presidente da Assembleia, deputado Adolfo Menezes (PSD).

Com o parecer da Procuradoria, a proposta acabou arquivada – o que não permitiu saber se os deputados governistas que a assinaram iriam manter a posição até o fim, rebelando-se de verdade contra a orientação do governo (que por natureza é sempre contra a investigação de seus atos) ou se recuariam, por livre e espontânea pressão, tão logo nomeações para cargos, liberação de emendas e outras benesses começassem a ser distribuídas, como geralmente ocorre.

Mas, se a criação da CPI do MST na Assembleia Legislativa da Bahia gorou, o mesmo não aconteceu com proposta no mesmo teor apresentada na Câmara dos Deputados. Sob intensa pressão da bancada ruralista e de líderes do agronegócio, a CPI da Câmara foi oficialmente criada e será instalada tão logo os blocos partidários indiquem seus 27 membros titulares e 27 suplentes.

A avaliação, entre parlamentares da oposição e também da base governista é que a CPI do MST acabará causado mais problemas ao governo que a também aprovada CPI Mista (formada por deputados e senadores) que vai investigar os acontecimentos do 8 de janeiro, quando o Palácio do Planalto, o Congresso e o Supremo Tribunal foram invadidos e depredados.

O raciocínio é que a CPI do 8 de Janeiro ficará apenas na retórica – afinal, o episódio já vem sendo investigado pela Polícia Federal, a pedido do STF, com os resultados das investigações sendo divulgados, por determinação do STF. Será apenas uma guerra de narrativas, para usar uma expressão da moda, dando seguimento ao que vem se desenrolando nas redes sociais nos últimos dias: governistas responsabilizando os bolsonaristas pela invasão e estes acusando os primeiros de terem feito uma armação para jogar-lhes a culpa nas costas.

Já a CPI do MST tem caminho para andar, pois a organização é parte integrante do próprio governo: o movimento conseguiu emplacar uma de suas coordenadoras nacionais, Kelli Mafort, como secretária de Diálogos Sociais e Articulação de Políticas Públicas da Presidência da República, e Milton José Fornazieri, coordenador de produção das cooperativas, no cargo de secretário de Abastecimento, Cooperativismo e Soberania Alimentar do Ministério do Desenvolvimento Agrário. Sem contar as diversas indicações de nomes para chefiar superintendências regionais do Incra.

A maior ou menor efetividade das investigações de uma CPI depende, evidentemente, da proporcionalidade entre governistas e oposicionistas na composição dos seus membros. A questão, no caso da CPI do MST, é que mesmo nos partidos que integram a base do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva há parlamentares alinhados à pauta da bancada ruralista e claramente contra as ações do MST.

Os políticos mais experientes sempre lembram, em casos como esse, um antigo jargão parlamentar, atribuído ao deputado Ulysses Guimarães, segundo o qual todos sabem como começa uma CPI, mas ninguém sabe como termina.

Em algumas áreas do governo, a previsão é que a CPI do MST tende a acabar bem… mas para a direita. Pode ser uma avaliação errada, mas, certamente, tudo o que um governo que prega a união nacional não quer, no momento, é ver o MST invadindo terras por aí.

 

*José Carlos Teixeira é jornalista, graduado em comunicação social pela Universidade Federal da Bahia e pós-graduado em marketing político, mídia, comportamento eleitoral e opinião pública pela Universidade Católica do Salvador.

 

 

 

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