Como é viver em cidades fortificadas

Carcassonne, França. Foto: Reprodução/BBC Travel
Carcassonne, França. Foto: Reprodução/BBC Travel
Apesar da percepção de que Jerusalém tem um clima político e hostil, "A sensação aqui é de que tudo vai ficar bem”, diz americana que vive na cidade. Foto: Reprodução/BBC Travel
Apesar da percepção de que Jerusalém tem um clima político e hostil, “a sensação aqui é de que tudo vai ficar bem”, diz americana que vive na cidade. Foto: Reprodução/BBC Travel

Enormes muros de pedra costumavam ser a última defesa das antigas cidades – estruturas construídas para proteger seus habitantes dos inimigos. Ao longo dos séculos, muitas dessas fortalezas ruíram. Mas aquelas que continuam de pé seguem protegendo um modo de vida privilegiado, ainda que afetado pelas restrições ao trânsito e pelas hordas de turistas.

Conversamos com alguns desses residentes em cinco das cidades fortificadas mais famosas do mundo – e tombadas como Patrimônio da Humanidade pela Unesco – para saber como é ter a História batendo à sua porta todos os dias.

Dubrovnik, Croácia

Já adorada por sua bela localização à beira do Mediterrâneo, Dubrovnik se tornou ainda mais popular nos últimos anos por servir como cenário para o seriado Game of Thrones. Os muros que percorrem cerca de 2 quilômetros em torno da Cidade Velha são do século 16, e suas ruas acessíveis apenas a pé ajudam a manter o clima de história no ar.

Dubrovnik, Croácia. Foto: Reprodução/ BBC Travel
Dubrovnik, Croácia. Foto: Reprodução/ BBC Travel

Segundo Maja Milovcic, nascida em Dubrovnik, a horda de turistas trouxe mudanças à cidade, com muitos moradores tendo deixado o centro antigo para alugar seus apartamentos a turistas. Mas os locais ainda se dedicam a preservar o modo de vida único criado ali. “As crianças que crescem na Cidade Velha têm um grande respeito pela história e pelos monumentos. Elas aprendem sobre o significado da arquitetura e da beleza para o futuro da cidade”, conta Milovcic.

Os muros também trazem uma sensação de comunidade unida. “Na infância, isso aqui parecia um grande playground para mim”, diz ela. Hoje, bairros como Ploce e Lapad, fora da fortificação, atraem moradores com suas vistas e os calçadões à beira-mar.

Jerusalém, Israel

Apesar de os muros que cercam a Cidade Velha terem sido erguidos no século 16, as pedras estão presentes nesse local desde os tempos bíblicos. “É possível sentir a ancestralidade de Jerusalém nas antigas pedras dos edifícios, nos nomes das ruas e nos moradores que nasceram e estão aqui há mais de oito gerações”, afirma Liz Cohen, americana que escreve um blog sobre a vida em Israel, chamado Lizrael Update.

Jerusalém, Israel. Foto: Reprodução/BBC Travel
Jerusalém, Israel. Foto: Reprodução/BBC Travel

Apesar da percepção de que Jerusalém tem um clima político e hostil, Cohen acredita que viver ali traz outra perspectiva da cidade. “A sensação aqui é de que tudo vai ficar bem. Os moradores são bem diferentes, mas sempre se ajudam. Vejo isso nos ônibus, nos mercados”, conta.

Tanto dentro como fora dos limites dos muros, os bairros de Jerusalém são ditados por nacionalidades ou religiões, apesar de algumas áreas serem mais misturadas. Estrangeiros tendem a se concentrar em bairros como Katamon e Rechavia. Nachloat, a 4 quilômetros da Cidade Velha, é popular entre estudantes por causa de suas características históricas e do mercado de rua de Mehane Yehuda Shuk.

Ávila, Espanha

Os muros de Ávila foram construídos no século 12 para proteger seus moradores dos conflitos entre os reinos de Castilla e León. Quase mil anos depois, eles continuam a circundar completamente essa cidade muito bem preservada, cheia de igrejas góticas e românicas.

Ávila, Espanha. Foto: Reprodução/BBC Travel
Ávila, Espanha. Foto: Reprodução/BBC Travel

“Parece que você mora dentro de um livro que se passa na Idade Média”, diz Carolina Ares, que nasceu em Ávila. “É mágico”.

A cidade é relaxada e muito hospitaleira. A maioria dos moradores é mais velha. E, apesar de uma intensa agenda de atividades culturais que homenageiam a história local, as noites costumam ser tranquilas.

Estrangeiros que buscam um pouco mais de agitação acabam se instalando ao sul da cidade, fora do limite da muralha. “É para onde Ávila está crescendo”, afirma Jorge García, morador local. “Há mais serviços e espaço aqui do que no centro histórico.”

Cartagena, Colômbia

Do outro lado do Atlântico e centenas de séculos mais tarde, os espanhóis construíram uma nova muralha. O porto caribenho de Cartagena acabou se tornando um importante posto para a Espanha colonialista.

Cartagena, Colômbia. Foto: Reprodução/BBC Travel
Cartagena, Colômbia. Foto: Reprodução/BBC Travel

Tanto ingleses como franceses realizaram ataques à cidade colombiana, e a Espanha gastou milhões oferecendo sua proteção durante o século 18 e seus piratas. O investimento trouxe a fortificação até os dias de hoje.

Para Silvia Tcherassi, estilista e dona do Tcherassi Hotel, viver dentro da Cidade Velha é “como estar no cenário de um filme”. As grandes casas, as animadas plazas, os cafés e restaurantes oferecem um pano de fundo cheio de vida para seus moradores.

Tcherassi acredita que Cartagena tem um ar tipicamente caribenho. “A Cidade Velha capta perfeitamente esse espírito feliz, simpático, vívido e dramático”, afirma.

Muitas das mansões coloniais dentro das muralhas foram transformadas em apartamentos modernos. Quem procura se instalar na cidade pode escolher ficar perto de uma das várias praças, onde moradores costumam se reunir para conversar. A Plaza de la Aduana é a mais antiga da cidade, enquanto a Plaza de los Coches encanta por suas casas de arcos coloniais.

A 1 km do centro, o bairro de Getsemaní atrai uma população mais hipster, com seus restaurantes e hotéis.

Carcassonne, França

Morar dentro dos limites da muralha de 3 quilômetros de “La Cité”, a cidadela medieval de Carcassonne, é respirar história constantemente.

Carcassonne, França. Foto: Reprodução/BBC Travel
Carcassonne, França. Foto: Reprodução/BBC Travel

“Você começa a imaginar como teria sido viver aqui há centenas de anos. Penso na habilidade incrível dos artesãos que construíram o castelo, as casas e os muros de La Cité, que foram capazes de resistir ao tempo”, afirma Jacqui Boulter, australiana que mora em Carcassone há dois anos, onde tem uma pensão.

Dentro da fortaleza, há menos do que 50 residentes permanentes – um número ínfimo se comparado com os 4 milhões de turistas que visitam a cidadela a cada ano. “Muitos turistas nem percebem que tem gente morando aqui. Eles pensam que se trata apenas de um monumento”, diz Boulter.

Nos últimos anos, viver dentro dos limites dos muros se tornou cada vez mais difícil, já que as agências bancárias e o correio fecharam, e o acesso a veículos é impossível durante os meses do verão.

Os que ainda se arriscam costumam se ajudar bastante e gostam da pausa que os turistas dão no inverno. Muitos estrangeiros acabam se instalando em Bastide St. Louis, na “parte nova” de Carcassonne, a 1,5 quilômetro da cidadela. O bairro tem museus e cafés bem populares.

*Lindsey Galloway, da BBC Travel

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