Herança Maldita 3 – Para seguir os passos de Lula, Jerônimo tem que combater o desmatamento

teixeira foto nova

José Carlos Teixeira*

“De nada vale tanto esforço do meu canto
Pra nosso espanto tanta mata haja vão matar
Tal Mata Atlântica e a próxima Amazônica
Arvoredos seculares impossível replantar”

(Matança, de Augusto Jatobá)

 

O desleixo com a defesa do meio ambiente, que tem resultado num acelerado e constante desmatamento das áreas remanescentes da Mata Atlântica e do Cerrado, no território baiano, integra a herança maldita que o governador eleito da Bahia, Jerônimo Rodrigues, vai receber ao assumir o cargo, em 1º de janeiro.

Uma questão que ele terá de enfrentar de imediato para não ficar na contramão dos esforços feitos antes mesmo da posse pelo presidente da República eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, que busca convencer o mundo de que o Brasil está pronto para retomar protagonismo na luta contra a crise climática e em defesa da floresta amazônica.

Afinal, não fica bem o governo federal se empenhar pelo desmatamento zero na Amazônia e, na Bahia, o governo estadual seguir com os olhos fechados ao avassalador ataque às áreas de Cerrado e Mata Atlântica no seu território.

Até porque os dois – presidente e governador – são do mesmo partido, o PT. Ou seja, aqui não vale aquela história de uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. Não dá para defender uma política de tolerância zero aos ataques ao meio ambiente no plano federal e, ao mesmo tempo, ser tolerante a eles no plano estadual.

Nem preservar um bioma e deixar que outro seja destruído. Os biomas são diversificados, mas a Natureza é uma só e esse planeta que habitamos ainda é nosso único lar – pelo menos até que o homem alcance as estrelas, embora haja dúvidas se a Terra resistirá até lá.

O fato é que a Bahia é campeã absoluta no infame campeonato de devastação da Mata Atlântica. Só no primeiro semestre deste ano foram desmatados 7.412 hectares no Estado, segundo o Sistema de Alertas de Desmatamento da Mata Atlântica.

No total, foram desmatados 21.302 hectares nos 17 estados com ocorrência do bioma. Mas a Bahia sozinha respondeu por um terço do total, destruindo 7.412 hectares. Por dia, suprimiu uma área de mata igual a 41 campos de futebol, volume correspondente à emissão de mais de 3,5 milhões de toneladas de CO2 equivalentes – que é a medida utilizada para calcular as emissões de gases de efeito estufa, que agravam as mudanças climáticas.

Mais violento é o desmatamento na região do Matopiba, nova fronteira agrícola que envolve uma área de 73 milhões de hectares do Cerrado nos estados de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, O Matopiba responde por cerca de 10% da produção de grãos e fibras do país, com destaque para soja, milho e algodão.

É a região que mais cresce, em área plantada, no país, segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Por conta disso, é também a região onde mais avança o processo de supressão da vegetação nativa conduzido pelo agronegócio, segundo o Relatório Anual de Desmatamento no Brasil, produzido pela MapBiomas.

No Cerrado baiano foram desmatados 92.500 hectares entre agosto de 2020 e julho de 2021, de acordo com dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais.

Somando tudo, incluindo outros biomas, a Bahia ocupa um nada honroso quinto lugar no ranking nacional do desmatamento, título conquistado no ano passado, quando contribuiu com 9,19% da área desmatada no país, correspondendo a 152.098 hectares – um aumento de mais de 43% em relação ao ano anterior.

Jerônimo Rodrigues terá muito trabalho nessa área, se quiser seguir os passos do companheiro Lula, a quem ele deve o mandato de governador, como não se cansa de repetir. Pode começar pela nomeação para a Secretaria de Meio Ambiente de alguém com formação técnica e sem vínculo com os desmatadores. E desde já começar a avaliar a extinção da “Licença Ambiental por Adesão e Compromisso” – que vem a ser o sonhado autolicenciamento que a bancada ruralista tenta implementar em nível nacional.

Instituída no governo do companheiro petista Jaques Wagner, esse autolicenciamento made in Bahia é mais ou menos como entregar a chave do galinheiro à raposa, depois de afixar na porta um documento dizendo que o animal só pode comer galinha na noite de Natal, cabendo-lhe apenas escolher se ao molho pardo ou no ensopado com batatas.

 

*José Carlos Teixeira é jornalista, graduado em comunicação social pela Universidade Federal da Bahia e pós-graduado em marketing político, mídia, comportamento eleitoral e opinião pública pela Universidade Católica do Salvador.

 

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