Ivete manda jogar as armas pra lá, mas a violência política aumenta e preocupa o TSE

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José Carlos Teixeira*

“Joga as armas pra lá
Joga, joga as armas pra lá
Joga as armas pra lá
Faz a festa”

(Muito Obrigado Axé, de Carlinhos Brown)

 

Dessa vez, Ivete Sangalo não se conteve. Quando cantava Muito Obrigado Axé, um ijexá de suave melodia composto por Carlinhos Brown, do qual tirei os versos que servem de epígrafe a esse artigo, ela surpreendeu a plateia do Florida Cup Fun Fest, em Orlando, Estados Unidos, no último dia 17, com um duro recado àqueles que defendem, incentivam e promovem o armamento da população, supostamente como medida de autoproteção:

– Vamos jogar as armas pra lá que a gente não precisa disso. A gente precisa é de amor, respeito, lucidez e progresso. Joga as armas pra lá. Violência gera violência – disse a cantora

A surpresa foi porque Ivete sempre manteve uma certa discrição a respeito de suas convicções políticas e ideológicas, poucas vezes se posicionando sobre temas polêmicos, em trinta anos de carreira marcados por muita festa e alegria.

No final de 2019, entrevistada para o Amigos, Sons e Palavras, programa comandado por Gilberto Gil no Canal Brasil, Ivete comentou que muita gente se manifesta para se exibir publicamente: “Fazer para mostrar ao outro é um erro, minha gente. É como fingir que está gozando, sacou?”

Explicou que hoje as pessoas falam mais do que fazem as coisas. Bom, não é o caso dela, que não gostou quando o então secretário de Saúde da Bahia, Fábio Vilas-Boas, usou o Twitter para lhe cobrar mais engajamento, em março do ano passado:

“Ivete, você deveria ser mais envolvida em questões sociais; o Brasil está a caminho do colapso na saúde, o que você fez para ajudar a evitar?”, questionou o secretário – que, aliás, deixaria o cargo cinco meses depois, diante da repercussão de um episódio em que chamou de “vagabunda” a chef de um restaurante após encontrar o estabelecimento fechado por conta do mau tempo.

Ivete rodou a baiana. Também pelo Twitter, rebateu o ataque gratuito de Vilas-Boas, dizendo que vinha, sim, fazendo sua parte, mas que o secretário pouco a conhecia e muito menos as ações que ela desenvolvia (sabe-se, por exemplo, que ela fez doações de camas, colchões e roupa de cama a hospitais para atender a doentes de covid-19). E bateu duro:

“Não o conheço. Me respeite!!! O senhor definitivamente desconhece os meus feitos. Aplique as suas impressões a ações que são da sua responsabilidade. Pratique isso com os seus, em busca de resultados para aqueles que o colocaram nessa posição. Trabalhe para o povo. ”

Na verdade, o curto discurso feito no show da Florida, dez dias atrás, foi a segunda manifestação de Ivete contra o armamento da população. Em julho do ano passado, durante uma live surpresa transmitida pelo Instagram, em um intervalo entre as canções, ela se posicionou:

“Para que arma, minha gente? Se arma fosse bom mesmo, a gente pegava e acabava esse vírus na base da bala! Mas, o que a acaba o vírus é a ciência e a medicina, a educação e o estudo”.

As novas declarações de Ivete, uma das mais famosas cantoras brasileiras, artista de prestígio internacional, que atrai multidões a seus shows e tem milhões de seguidores nas redes sociais (só no Instagram são quase 35 milhões), ganharam mais peso agora por conta de recentes informações divulgadas pela imprensa:

  1. O vertiginoso aumento do armamento civil no país. Só no ano passado, pessoas registradas como caçadores, atiradores e colecionadores (os chamados CACs) adquiriram 450 mil novas armas, desde pistolas a fuzis.
  2. Bandidos ligados ao tráfico de drogas estão aproveitando as facilidades no registro de CACs para comprar, legalmente, armamento e munição. com um registro de atirador, um integrante do crime organizado ou um laranja pode comprar 30 armas, sendo 15 fuzis de uso restrito e 6 mil munições por ano. Já o que consegue o registro de colecionador não terá limite de compra de armas – desde que compre o máximo de cinco unidades de cada modelo.

Isso sem falar no crescimento dos casos de violência política registrado nos últimos dias, a exemplo da morte de Marcelo Arruda, tesoureiro do PT de Foz do Iguaçu (PR), baleado pelo bolsonarista José Guaranho enquanto comemorava o seu aniversário.

A elevação da temperatura da disputa eleitoral, com o registro de vários casos de agressões e de atentados à liberdade de imprensa por motivação política, levou o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a criar um grupo de trabalho para estudar medidas adicionais para enfrentamento à violência política no contexto das eleições de outubro.

Há esperanças de que dê certo. Mas, por entanto, o clima é pesado e teme-se pelo pior.

 

*José Carlos Teixeira é jornalista, graduado em comunicação social pela Universidade Federal da Bahia e pós-graduado em marketing político pela Universidade Católica do Salvador.

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