O rugido do leão, o tênis de corrida e a dura batalha por uma cadeira de deputado

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“O medo é o verdadeiro e único inimigo.”

(Sun Tzu, A Arte da Guerra)

José Carlos Teixeira*

 

Dois caçadores descansavam à sombra de uma árvore, no meio da floresta, quando se ouve um forte rugido.
– É um leão! – gritou um deles, apavorado.
Rapidamente, o outro abriu a mochila, de onde tirou um par de tênis de corrida, que começou a calçar.
– Por que você está calçando esse tênis? – perguntou o parceiro. – Você acha que é capaz de correr mais do que o leão?
– Não! Mas acho que sou capaz de correr mais do que você!

A piada é velha, mas vale a pena contá-la, pois é exatamente assim que anda a campanha da maioria dos deputados federais baianos que vão disputar a reeleição. Eles acordam ouvindo rugidos de leão e vendo os candidatos concorrentes sacando os tênis de corrida de suas mochilas.

Como em nenhuma outra eleição, o medo de não conseguir reeleger-se tem sido um sentimento presente no dia a dia da maioria dos integrantes da bancada da Bahia na Câmara dos Deputados, sobretudo os que vão disputar o pleito abrigados nos partidos que compõem a base governista.

“Será a eleição mais difícil da minha vida”, confidenciou-me um deputado governista.  E não é um deputado qualquer: ele foi um dos mais votados no último pleito e tem a experiência de quem, há décadas, disputa uma eleição a cada dois anos – para deputado e para prefeito de sua cidade.

São vários os motivos para tanta preocupação, a começar pelo fim das coligações para as eleições proporcionais. Agora, os partidos conquistarão as cadeiras de deputado unicamente com os votos que receberem, exceto se constituírem federações partidárias, uma novidade criada na última reforma eleitoral – mas até agora apenas uma federação está encaminhada: a que une PT, PCdoB e PV.

O medo de não conseguir se eleger é maior entre os deputados da base governista. É que dessa vez, ao contrário de 2018, a oposição tem um candidato a governador competitivo: ACM Neto, do União Brasil, o novo partido criado com a fusão do DEM com o PSL, vem liderando as pesquisas de intenção de voto realizadas até agora. Como se sabe, candidato a governador competitivo acaba puxando votos para os deputados dos partidos que o apoiam.

Isso significa que se Neto permanecer na liderança, os oposicionistas deverão ganhar mais algumas vagas de deputado federal – as estimativas da oposição apontam para a conquista de pelo menos mais cinco cadeiras – e obviamente os governistas perderão o mesmo número.

Outro componente de peso na dura luta pela conquista de votos para deputado, mas ainda impossível de mensurar por suas próprias características, é o resultado da farta distribuição de recursos federais por meio de emendas do “orçamento secreto” – assim chamado porque não há um mecanismo claro de acompanhamento de quem é o padrinho das indicações para esse tipo de emenda feita pelo relator, nem onde o dinheiro foi aplicado ou mesmo o objetivo da ação.

Os cálculos indicam que o tal orçamento secreto, que é controlado pelos partidos que integram o Centrão, destinou cerca de R$ 36 bilhões em emendas para os deputados da base governista entre 2020 e 2021, mais outros R$ 16 bilhões este ano.

Deputados da base do governador Rui Costa, que fazem oposição ao governo federal, relatam que suas bases eleitorais vêm sendo invadidas por deputados do Centrão, amparados em verbas de valores bastante elevados, obtidas por meio do orçamento secreto.

Contam que quando um deles, com muito custo, consegue obter a liberação de uma emenda no valor de R$ 1 milhão para a prefeitura de um município onde é tradicionalmente votado, logo em seguida aparece um deputado ligado ao governo federal oferecendo uma verba de R$ 10 milhões ao prefeito, mas com uma condição: que rompa o compromisso assumido com o adversário.  Não há como competir, dizem.

Como se não bastasse, há ainda as eternas queixas de invasão de bases eleitorais pelos próprios companheiros. Candidatos petistas queixam-se de que o principal articulador político do governador Rui Costa, o secretário de Relações Institucionais Luiz Caetano, tem invadido bases eleitorais de companheiros em busca de votos para sua própria mulher, Ivoneide, pré-candidata à Câmara dos Deputados.

A mesma queixa é ouvida entre os bolsonaristas: João Roma, pré-candidato a governador pelo PL, o partido do presidente da República, tem se preocupado mais com a candidatura da própria mulher, Roberta, a deputada federal, em detrimento dos demais candidatos bolsonaristas.

Ambos negam, é claro.

Certo é que, pelo sim, pelo não, já há candidato a deputado dormindo calçado com belos e confortáveis tênis de corrida. Nunca se sabe de onde virá o rugido do leão.

 

*José Carlos Teixeira é jornalista, graduado em comunicação social pela Universidade Federal da Bahia e pós-graduado em marketing político pela Universidade Católica do Salvador.

 

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