Cartinha para o futuro governador da Bahia ler antes do Natal

foto texeira nova

José Carlos Teixeira*

“Papai Noel

Vê se você tem

A felicidade

Pra você me dar”

(Boas festas, de Assis Valente)

 

Caro professor,

Permita-me que o trate assim. Prometo que a partir de 1º de janeiro passarei a tratá-lo como “excelentíssimo”, de acordo com o que exige a liturgia do cargo que o povo da Bahia lhe confiou pelos próximos quatro anos. Mas é que, como todos sabem, os cargos passam, são transitórios. Já o título de professor, esse a pessoa carrega pela vida inteira e acho que dele o senhor deve orgulhar-se muito.

Li nos jornais sobre a reforma administrativa concebida por sua equipe para ajustar a estrutura do governo aos propósitos e metas de sua gestão, que desejo profícua, exitosa e merecedora do reconhecimento dos baianos.

À primeira vista, me pareceu que era uma mera troca de seis por meia dúzia, robustecida, no entanto, com a criação de 200 novos cargos de livre nomeação – o que entendo, pois deve haver uma fila enorme de gente esperando ser nomeada no novo governo.

Em uma segunda mirada, porém, vi que alguns pontos merecem aplauso, como a extinção da Bahiatursa. Um órgão que vinha servindo tão somente como balcão de distribuição de verbas para as festas de prefeituras amigas do governo – e desmoralizado no trade, desde o ridículo episódio em que alguns dos seus dirigentes se fantasiaram para promover o destino Bahia em uma feira de turismo no exterior. Um vexame!

Considerei muito relevante a criação de estruturas para, efetivamente, cuidar de gente. Cuidar de verdade e não apenas na propaganda governamental. É o caso do anunciado programa Bahia sem Fome, que terá sua coordenação dentro da Casa Civil, ou seja, a dois passos do gabinete do governador. É simbólico. Deixa clara a intenção de realmente combater a extrema pobreza – situação em que se encontram 5,7 milhões baianos, segundo informações do CadÚnico.

Confesso que esperava ver alguma proposta nova na área da segurança pública. Algo que sinalizasse uma mudança no tratamento da questão, já que a prática bolsonarista do “bandido bom é bandido morto”, praticada ao longo dos últimos anos, não tem se mostrado eficaz, pois a violência segue crescendo. Sem falar que essa guerra sem quartel, travada sobretudo nas áreas periféricas, onde mora a gente mais pobre, tem um efeito colateral trágico: muitos inocentes, inclusive crianças, têm perdido a vida.

A propósito, a partir do primeiro dia de janeiro, como é de praxe, o senhor e sua família passarão a ocupar a residência oficial do governador, o Palácio de Ondina. Recomendo-lhe bastante cuidado. Para chegar lá, há dois acessos. Um é a Ladeira do Zoológico, a partir da Avenida Milton Santos (a antiga Avenida Ademar de Barros, aquele do “rouba, mas faz”). O outro acesso é pela Avenida Anita Garibaldi, subindo a Rua do Corte Grande. Evite esse. É área dominada pelo tráfico e já houve caso de toque de recolher, com ordens para o comércio fechar e os moradores se recolherem a suas casas.

Aliás, não é recomendável circular pela Garibaldi à noite. No final do mês passado ali foi registrado um intenso tiroteio que deixou os moradores apavorados. Foi polícia contra bandido e três morreram.

Mas nem pense em passar pela Avenida Vasco da Gama. Ali, a situação é bem mais perigosa. Sabe aquele conjunto residencial Santa Madalena? Um que fica em frente ao supermercado Bompreço? Pois ali os tiroteios são tão comuns que muita gente se mudou, com medo, pôs o apartamento à venda bem abaixo do valor de mercado e não tem encontrado comprador. Também, pudera… Quem vai ali é coelho, como diz o baiano.

Não é muito aconselhável também seguir pelo topo da colina, pela Avenida Cardeal da Silva, na Federação. As ruas transversais, à noite, são boca quente. É uma área de intensa disputa entre facções rivais.

A melhor opção ainda é seguir pela Orla, pela Avenida Oceânica. Se bem que também guardando cuidado ao passar pelo Rio Vermelho – no mês passado, três carros pararam em frente a um daqueles bares com mesas na calçada que existem por lá, desceram seis homens e executaram a tiros dois clientes.

Sabe, professor, bom mesmo é, sempre que possível, usar o helicóptero. Aliás, do jeito que as coisas andam, helicóptero virou sonho de consumo para muita gente. Eu mesmo fiz uma cartinha a Papai Noel, pedindo um de presente de Natal. Mas como não acredito no Bom Velhinho, sei que que é brinquedo que não vem. O jeito é circular pela cidade o mínimo possível. Mas a gente tem que sair para trabalhar, para ir à escola, fazer o quê? Quem sabe um dia a situação melhora. Vamos rezar para isso.

Feliz Natal, professor.

Que o próximo ano seja bom para todos nós.

 

*José Carlos Teixeira é jornalista, graduado em comunicação social pela Universidade Federal da Bahia e pós-graduado em marketing político, mídia, comportamento eleitoral e opinião pública pela Universidade Católica do Salvador.

 

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