Esqueça seus medos, o governador não quer saber de notícias ruins no Carnaval

teixeira

José Carlos Teixeira*

“Você tenha ou não tenha medo

nego, nega, o carnaval chegou

mais cedo ou mais tarde acabo

de cabo a rabo com essa transação de pavor”

(Deus e o Diabo, de Caetano Veloso)

 

Se pudesse, o governador Jerônimo Rodrigues, nesse Carnaval, cobriria a Bahia com um enorme pano colorido – de preferência com as cores verde, amarela e vermelha, da bandeira rastafari, para dar um certo toque de africanidade – e escreveria por cima: “Aqui é só alegria!”

Mas seria uma operação custosa. Muito custosa. Mais cara até que a construção da Ponte Salvador-Itaparica, o sonho de consumo de todos os petistas que sentaram na cadeira de governador da Bahia. Como não é possível tal operação, o governador deixou-se possuir, de leve, por um espírito ricuperiano – valha o neologismo.

Como sabe o caro leitor, sempre bem informado, em 1994, o então ministro da Fazenda, Rubens Ricúpero, numa conversa com o jornalista Carlos Monforte, enquanto se preparavam para entrar ao vivo no Jornal da Globo, afirmou: “Eu não tenho escrúpulos; o que é bom a gente fatura, o que é ruim a gente esconde.” Só que a conversa vazou pelo canal privativo de satélite, acessível a todos que tinham uma antena parabólica.

Passaram-se quase 30 anos, mas a lição do episódio – que ficou conhecido como “o escândalo da parabólica” e custou o cargo ao ministro – não conseguiu evitar que ainda hoje muita gente boa recorra, de vez em quando, à receita de Ricúpero.

Na madrugada desta quarta-feira, 15, moradores dos bairros Calabar e Alto das Pombas, nas proximidades do circuito Barra-Ondina, o mais procurado do Carnaval de Salvador, acordaram por volta das 3 horas com um intenso tiroteio. Acionadas, equipes da Polícia Militar fizeram rondas no local, mas não encontraram os atiradores. Quando a presença da PM diminuiu, por volta das 5h30 a fuzilaria recomeçou. Parou com a volta das guarnições policiais, que mantiveram a ocupação total da área durante todo o dia e a noite seguinte.

Após a repercussão dos tiroteios, ocorridos em área tão próxima da folia, o governador Jerônimo Rodrigues fez um apelo à imprensa, sobretudo às emissoras de televisão, para que não sejam divulgadas imagens de violência e “degradantes” durante os dias de Carnaval. Alegou que é preciso fazer da festa um cartão postal do turismo baiano.

Ou seja, Ricúpero total.  Pelo desejo do governador, a imprensa baiana deve noticiar apenas o que é bom e esconder o que é ruim. Nada mal para quem, na semana anterior, já acusara a mídia de agir com má-fé por criticar as deficiências na área de segurança pública do governo.

Tudo isso soa como ensaio do que se deve esperar de um governo que nem completou dois meses e já busca negar ao cidadão o direito de manter-se informado sobre o que ocorre na terra onde vive e o de livremente criticar a gestão do governante que ele elegeu. A continuar assim, vamos acabar com esbirros nas redações decidindo o que pode e o que não pode ser noticiado.

 

*José Carlos Teixeira é jornalista, graduado em comunicação social pela Universidade Federal da Bahia e pós-graduado em marketing político pela Universidade Católica do Salvador.

 

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