Pula n’água, marujada: o governador disse que vai tirar o sonho da ponte do papel

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José Carlos Teixeira*

A canoa virou, deixa virar

Por causa de (nome da pessoa)

Que não soube remar

(A canoa virou, de Braguinha)

Fosse lá no sertão, diríamos, sem medo de errar, que ali teve cabeça de burro enterrada, tamanha a urucubaca que o cerca, desde sua criação até os dias de hoje. Mas, mesmo operando na Baía de Todos-os-Santos, tendo a terra firme apenas como ponto final nos dois sentidos, o sistema ferryboat, que liga Salvador à Ilha de Itaparica, é uma sucessão enorme de reveses, enganos, azares, malogros e, sobretudo, trapalhadas e espertezas.

Não, meu preocupado leitor, não estou falando da colisão entre duas embarcações do sistema – os ferries Pinheiro e Maria Bethania – ocorrida na manhã desta segunda-feira, 6, quando manobravam, um saindo e o outro chegando, nas proximidades do terminal de Bom Despacho, na parte insular do sistema.

No choque ninguém se feriu e os barcos sofreram apenas arranhões no casco. Foi apenas um susto, devidamente registrado em vídeos postados depois nas redes sociais e mostrados nas emissoras de tv e sites de notícias.

Afinal, não foi uma cena incomum. Colisões e embarcações à deriva são problemas operacionais comuns, quase sempre resultados de incúria gerencial, imperícia e falta de manutenção. No dia 16 de fevereiro do ano passado, por exemplo, o mesmo ferryboat Pinheiro, que fora rebocar o Anna Nery, à deriva na baía após uma pane nas máquinas, acabou se chocando com o barco avariado que fora socorrer. Melhor que isso só filme dos Trapalhões na sessão da tarde.

Os problemas do sistema vêm de longe. Inaugurado solenemente pelo então governador Luiz Viana Filho em 8 de dezembro de 1970, só começou a operar em 5 de setembro de 1972, já no governo de Antonio Carlos Magalhães. É que a entrega dos dois primeiros barcos, o Agenor Gordilho e o Juracy Magalhães, atrasou dois anos e meio.

Em 1987, no primeiro ano da gestão de Waldir Pires, os ferries Vera Cruz e Monte Serrat foram retirados da frota na marra e levados para o Maranhão, em uma manobra até hoje pouco esclarecida, mas cujo objetivo era prejudicar o novo governador.

Rebatizados de Pinheiro e Alcântara, os dois barcos, que haviam sido comprados pelo governo da Bahia com financiamento do BNDES, foram usados para inaugurar a travessia entre São Luiz e Alcântara. Só foram trazidos de volta em 1992, no terceiro governo de ACM.

Durante esses 30 anos, o sistema foi operado pela estatal Companhia de Navegação Baiana e por várias concessionárias – a atual é a Internacional Travessias Salvador. Sempre com a operação criticada pelos usuários e sob a eterna complacência da Agerba, a Agência Estadual de Serviços Públicos de Energia, Transportes e Comunicações da Bahia.

Enquanto isso, o governo estadual segue acalentando o sonho da construção da hoje tão famosa quanto controversa Ponte Salvador-Itaparica, projeto anunciado em 2008 pelo governador Jaques Wagner, mas que até agora não saiu do papel.

Na manhã desta segunda-feira, porém, o governador Jerônimo Rodrigues, que está no cargo há apenas 37 dias, disse em entrevista que nos próximos 100 dias vai acelerar o processo e finalmente iniciar as obras físicas de construção da ponte. Ou seja, como garantiram seus dois antecessores repetidas vezes: agora vai. Crédulo que sou, eu acredito.

P.S. Se algum dos entoados leitores ou afinadas leitoras se dispuser a cantar a marchinha cujos versos usei como epígrafe desse artigo, deve substituir aquela parte entre parênteses onde se lê “nome da pessoa” pelo nome que considerar mais conveniente ou apropriado. Eu preferi não escrever o nome que tenho na mente, mas cantei e ficou muito bom.

 

*José Carlos Teixeira é jornalista, graduado em comunicação social pela Universidade Federal da Bahia e pós-graduado em marketing político, mídia, comportamento eleitoral e opinião pública pela Universidade Católica do Salvador.

 

 

 

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